Eramos nós dois numa dança, no meio da rua, no cais sob a lua, num restaurante fino ou num boteco de quinta. Éramos nós dois na luz e na escuridão. Na claridade da certeza e na penumbra da dúvida. Escondidos a meia luz, num refúgio calmo dentro de nós dois e tempestuoso do lado de fora, como parecia apropriado para a sina de dois amantes. Eramos nós dois numa praia deserta, a luz de velas velando sentimentos profundos. Eramos nós dois no refúgio de uma concha, dentro de um sorriso. Eramos nós dois uma aura leve. Eramos nós dois um sentimento reprimido e longas conversas . Eramos nós dois uma revelação. Eramos nós dois um "nós" tímido. Eramos nós dois um quinta chuvosa. Eramos nós dois e o sol nascia, as cinco da manhã quando os pássaros cantam. Eramos nós dois uma terça ensolarada. Eramos nos dois um bilhete, uma surpresa, um choro desesperado. Eramos nós dois um triste adeus. Eramos nós dois a reconciliação, um desejo profundo, uma declaração, eramos nós dois um do outro mais a cada dia. Eramos um do outro uma saudade, um romantismo, um último romance. Eramos nós dois um drama, uma vontade de ficar junto. Eramos nós dois visões de futuro. Eramos nós dois brigas e corações. Eramos nós dois vendedor e freguesa a trocar presentes. Eramos nós dois, sim, uma certeza. Eramos nós dois brigas e corações, mais uma vez. Eramos nós dois um devaneio final, uma tempestade sem promessa de calmaria, sem corações. Eramos nós dois o silêncio e a distância. Eramos dor e tristeza. Somos, ou não somos mais tudo isso que parecíamos ser?
Muitas vezes chove naquela terra de ninguém. Chuva, tempestade, tormenta, raio, trovão. O povo se esconde, dentro das casas de pedra, e se põe a pensar. E como a tempestade nunca termina, o povo nunca para de pensar. E pensa. E os vizinhos daquela terra de ninguém não sabem que os pingos da chuva são idéias, e a terra fértil é a própria consciência.
segunda-feira, 29 de dezembro de 2014
O último domingo
Dormingo.
Dor que míngua
de novo.
Assombra os dias meus.
Oh, que dor.
Que dor de domingo.
Que se vai nesta tarde.
Neste céu azul em ressaca.
Tic-tac, o tempo passa.
Sibila uma pergunta.
Paira no vento.
Ela sorri, faz pirueta.
Assobia e faz careta.
Mas não fala.
Domingo, dormingo, dor que míngua.
O ultimo domingo do ano.
Nem por isso a ultima dor.
Tic tac, o tempo passa.
O ano se foi.
Já.
Ontem eramos nós dois.
Agora já não somos mais.
Ontem o silêncio era chato.
Já não é mais.
Ontem era escuro.
Já está claro (?)
Ontem dançávamos.
Uma valsa bela.
Uma falsa vela.
Já não dançamos mais.
Ontem era eu.
Já não sou mais.
Cadê
o
que
eu
perdi
aqui,
naquele
domingo.
Oh, que dor
Eu já nem sei mais
fazer esses versos
que tão fácil saiam.
Já não sei mais, será.
Ser poesia.
Que vontade de gritar.
Pra quebrar
O silêncio chato,
desse domingo.
Que vontade de gritar
E quebrar
O nosso silêncio.
Que vontade de te chacoalhar.
Te fazer lembrar
Do admirável mundo novo
Que nós dois víamos em sonhos
E ouvíamos numa concha.
quarta-feira, 24 de dezembro de 2014
quarta-feira, 17 de dezembro de 2014
Sonho
Nunca tive certeza se sonhava mesmo com você.
Gostava de pensar sim.
Essa noite sonhei, um sonho febril.
Você me dizia "Não sei quanto tempo vou aguentar sentir sua falta".
Eu, meio consciente, tive que acordar.
Queria acreditar que era verdade.
Mas era só sonho.
E então, não dormi mais.
Gostava de pensar sim.
Essa noite sonhei, um sonho febril.
Você me dizia "Não sei quanto tempo vou aguentar sentir sua falta".
Eu, meio consciente, tive que acordar.
Queria acreditar que era verdade.
Mas era só sonho.
E então, não dormi mais.
Assim falava Zaratustra
Dez vezes ao dia deves saber vencer-te a ti mesmo.
Isto cria uma fadiga considerável e esta é o ópio da alma.
Dez vezes deves reconciliar-te contigo mesmo,
porque vencer-se é amargo e o que não está reconciliado dorme mal.
Dez verdades há de encontrar durante o dia,
Caso contrário passarás a noite a procurá-las e tua alma acabará faminta.
Dez vezes ao dia precisas rir e conservar a alma serena.
Senão serás atormentado a noite pela melancolia.
Isto cria uma fadiga considerável e esta é o ópio da alma.
Dez vezes deves reconciliar-te contigo mesmo,
porque vencer-se é amargo e o que não está reconciliado dorme mal.
Dez verdades há de encontrar durante o dia,
Caso contrário passarás a noite a procurá-las e tua alma acabará faminta.
Dez vezes ao dia precisas rir e conservar a alma serena.
Senão serás atormentado a noite pela melancolia.
terça-feira, 16 de dezembro de 2014
52.287
E eis que ali, mais uma vez, estava o vendedor. Prostrava-se atrás de seu tabuleiro, recostado indiferentemente sobre a cadeira. Nas mãos tinha um pequeno pedaço de pano, um quadrado de tecido macio sem nenhum detalhe com a qual carinhosamente polia um conjunto de pequenas garrafas. Várias delas estavam dispostas sobre o tabuleiro, e estranhamente nenhum dos itens usuais que ele costumava vender estavam ali junto com ele. As garrafinhas que estavam lá eram diferentes das usuais. Na verdade, hoje não era um dia de negócios. Era uma manhã azulada quando ele acordou daquele dia e, diferentemente do resto banal das pessoas, o azul lhe trouxe uma tristeza grande. A flor da hipocondria que nascia em seu jardim era azul, dessa vez. Mas eram nos dias ensolarados que as pessoas costumavam comprar felicidade, que ele vendia em garrafas que não eram como aquelas. Ocorre que o dia nublou: uma tempestade nebulosa abraçou a cidade, e em dias cinzentos não há porque comprar felicidade. Infelizmente o vendedor não possuía tristeza e angústia para vender que não bastassem as próprias, e em dias de chuva quer-se tristeza e angústia. Quem passava ali sentia uma falta pungente. Havia um pedaço faltante naquele quebra cabeça. Uma peça, e daquelas importantes, que dificultam o entendimento da obra. Certamente, arriscavam dizer com pomposa certeza, a bela moça que havia feito negócios com ele recentemente não viria mais vê-lo, pelo menos por um tempo. E era verdade. A despeito de seu sincero convite para o paraíso perdido, a moça preferira embarcar numa outra viagem pra uma terra diferente. Pegou a moeda mágica que havia comprado, sussurrou um desejo na fonte e se foi. Não se sabe ao certo para onde, e que terras, áridas ou verdejantes, ela iria encontrar. Peneirava uma chuvinha fina agora, igual ao choro dele naquele momento ao polir com carinho as garrafinhas. Era um choro que lavava a alma. E misturado a ele havia um sorriso, que o fazia provar das próprias lágrimas. Tinham gosto de despedida, mas deixavam consigo uma lembrança, uma possibilidade - não promessa, veja - de retorno, um desejo profundo guardado no fundo da alma que ele, tão bem calejado, guardaria durante longo tempo. Devido a tal incidente retirara as garrafas de dentro de um baú que guardava debaixo do tabuleiro. Eram as garrafas de memórias. Memórias dele. Não as venderia, jamais, por isso estava fechado para negócios. Acontece que nessas horas é comum recorrer a memória em busca de conforto. Polia uma por uma com serena determinação, e sempre ocorria de se perder por ali. Depois de terminar as memórias, guardou-as no baú, mas antes de fazê-lo, pegou de dentro do baú outro baú. Um baú dentro de um baú, para guardar segredos profundos. Era uma caixa bem simples, de madeira opaca. Nenhum detalhe, nenhum alarde. Nenhuma anunciação pra guardar memórias profundas. Dentro dela havia dois frascos de vidro em formato de esfera. Um deles era totalmente sólido, e na solidez (pra não dizer solidão, que cabia também ao momento) curvas pareciam se perder, e do outro emanava uma voz calma e sincera. Eram objetos delicados, guardados com um tom sentimental. Neste momento o vendedor passou longo tempo a olhá-los. Colocou-os sobre o tabuleiro - agora vazio. Sua expressão permaneceu imóvel, tácita, sóbria. Havia um tom de pesar nos seus olhos e um sentimento de dor pelos objetos: uma leve mistura que culminava numa raiva sibilante. Por fim saiu de longa meditação e tirou do bolso um outro frasco: um terceiro, de mesmo formato que os outros três. A diferença é que esse terceiro acabara de ser feito. E a grande diferença é que era oco por dentro, e havia sido feito pra ser daquela forma e abrigar dentro de si o que viesse. Esse frasco arrancou um sorriso do vendedor. Um sorriso que lembrava a felicidade. E eis que então ele se convence de que a caixa não era lugar para aquela peça. Guarda o baú do baú debaixo do tabuleiro e galga a mais alta parte da estante atrás da sua cadeira, onde os clientes sempre passavam os olhos. Lá, bem no alto, põe a esfera oca. Mas ao remeter as outras se dá contas de que nenhuma era tão bonita e tão verdadeira quanto a última. Não se sentia realmente satisfeito ou agradecido com nenhuma das duas primeiras. Ele retorna as duas primeiras ao baú do baú e lá as esquece, mas deixa a terceira ali, no alto da estante. Dali pra frente, passaria a viver como antes. Ou tentaria. Os dias passariam e aos poucos ele se acostumaria. Não diria que esqueceria do ocorrido, da moça, do sorriso: não, isso jamais. Por mais que pudesse parecer que, no futuro, sua vida voltasse ao normal, deixaria o frasco lá pra sinalizar que pelo menos durante um longo tempo ele estaria ali pra ser preenchido, mas também pra dizer que ela teria sempre um lugar especial entre as coisas especiais.
segunda-feira, 15 de dezembro de 2014
Pedido
Freguesa,
Eu só espero que você não se convença que a sua solução é a solidão.
Eu só espero que você encontre coragem pra acreditar no que eu te disse.
E se, eventualmente, depois de tudo isso, você se ver perdida, sabe onde me procurar.
Ainda dá pra resgatar a moedinha do fundo do poço. E a gente pode ignorar as coisas ditas nessa noite de ira.
Só vê se não demora.
Tenta ser breve,
por nós.
Eu só espero que você não se convença que a sua solução é a solidão.
Eu só espero que você encontre coragem pra acreditar no que eu te disse.
E se, eventualmente, depois de tudo isso, você se ver perdida, sabe onde me procurar.
Ainda dá pra resgatar a moedinha do fundo do poço. E a gente pode ignorar as coisas ditas nessa noite de ira.
Só vê se não demora.
Tenta ser breve,
por nós.
domingo, 14 de dezembro de 2014
Diálogo
Naquela esquina havia um certo vendedor, que vivia de vender artigos curiosos. Alguns diziam que ele vendia sonhos, outros, ilusão. Pouco se sabia sobre ele, mas era conhecido e prosperava. Certo dia uma bela moça chegou perto de seu tabuleiro, e ele rapidamente pôs-se a vender seus produtos. Esperto que era, notou na moça certa aflição, e do fundo da tenda retirou do seu baú secreto seus produtos mais valiosos. "Tenho uma garrafa de sorrisos, uma baú com a felicidade, uma caixinha com amor e esta moedinha mágica" disse, correndo a moeda por entre os nós dos dedos, "que você pode jogar no poço e fazer um pedido". A moça sorriu e perguntou "Seriam pedidos silenciosos?". E seu sorriso foi tão bonito que o coração do vendedor amoleceu. Havia algo diferente nela. Poderia ser o sorriso, os olhos profundos, a silhueta graciosa. Algo mexeu com ele, e acabou dizendo, meio bobo: "São sim, a gosto da freguesa". A moça sorriu de novo, e seu riso era mesmo bonito: quem passava parava e sorria também. "Quero a moedinha!" disse, parecendo mais feliz."É uma boa escolha", respondeu o vendedor, encantado. "Você pode pegar todos, se quiser", apressou-se a dizer "Sou barateiro: você pode pagar com sorrisos", acrescentou, sem jeito, e, por fim, se desmanchou: "Posso te dar o meu coração numa bandeja também. Ele vai até de graça, mas se você me der o seu ficarei agradecido. E será um excelente negócio, que te parece?". A moça sorriu, de novo, sem se assustar e de novo o vendedor sorriu, aliviado. Era como se soubessem da iminência daquele episódio. Ela perguntou: "Essa negociação é pra hoje?", e entristeceu levemente: "Porque algumas coisas não me parecem viáveis". "Aqui é a freguesa que manda", disse prontamente o vendedor, só pra arrancar mais um sorriso dela (e conseguiu). "Posso ir te pagando com os sorrisos então", ela disse. "Negócio fechado, freguesa", respondeu ele, em troca. "Sorrisos pela moeda mágica!", disse a moça, subitamente. "Sim, freguesa, mas negócios são negócios, você tem que pagar" e ela sorriu de novo, pagando. O vendedor sorriu também, mais uma vez. "Os outros três itens são pra depois?", perguntou "Quatro, aliás" corrigiu, dando ênfase ao coração na bandeja, "E por sorrisos, que pechincha!". A moça parou subitamente, séria, escondendo o sorriso de uma maneira brincalhona, seu cabelo lhe caiu sobre o rosto e num gesto gracioso ela o arrumou, dizendo: "Está desfazendo dos sorrisos da freguesa?". Seu corpo esguio pendeu pro lado, e o vendedor acompanhou o movimento, para o outro lado, como numa dança. Dessa vez ele quem sorriu: "Perdão freguesa, expressei-me mal. É que sou um homem dos negócios, essa coisa de atuação nunca deu certo pra mim. Quis dizer que os meus itens são valiosos, acho que faria bom uso deles. Quer que eu embale a moeda pra viagem?". Ela riu das palavras do vendedor, e do modo como elas foram ditas de modo desajeitado, porém com profunda sinceridade. Havia nele um desejo maior do que simplesmente vender as coisas. Ele queria vender pra ela, e ela sabia disso. E queria comprar tudo. "Entendi", respondeu. "Não precisa embalar não. Prefiro tê-la agora". O vendedor estendeu a moeda e deixou-a cair na mão da moça. Sua mão pousou sobre as dela e seus olhares se encontraram. "Faça bom uso", disse ele. Desviou o olhar sem jeito, mas não resistiu e olhou pra ela de novo "E a freguesa quer dizer porque não quer a garrafa de sorrisos, o baú com a felicidade e a caixinha com o amor?" indagou, sem jeito, deixando o coração de lado: naquele momento teve medo. "Acho que você devia pegá-los, desculpe a invasão", disse com a voz mansa, que diminuía aos poucos. "Eu quero!", respondeu ela rapidamente, como se com o mesmo medo que ele tinha, como se para animá-lo de novo. "Mas eu queria pegar aos poucos: tenho medo de não tê-los mais tarde, de esgotá-los". "Pode pegar todos de uma vez, se for a vontade de freguesa" apressou-se a dizer o vendedor. "Garanto que sempre vai chegar coisa nova. E pra fazer propaganda do produto: o baú da felicidade e caixinha com amor são tão fundos que eu nem conheço o fim deles. Até digo pra você tomar cuidado pra não se perder por ali. E veja que coisa bonita, nunca ninguém os teve, serão exclusivos seus. Que te parece?". A moça sorriu, e havia leveza no ar "Você está me convencendo", disse. "Sou bom nisso. É assim que se sobrevive aos negócios", gabou-se o vendedor. "Posso te dizer mais tarde?", perguntou a moça. "Pode sim, freguesa. Minha vontade é de vendê-los logo, mas posso guardá-los pra você. Ficarei feliz em saber que esses itens tão preciosos tem um comprador. E não esquece do coração na bandeja também", arriscou ele, sem resistir "Se você quiser pode até pagar depois", continuou, meio desesperado. "Mas é meio triste isso de coração na bandeja, não acha?" indagou a moça, pra surpresa do vendedor. Ele sorriu e disse: "Ora freguesa, não desfaça do produto. Ele tá aí de bom grado, e é bem difícil por ele aí, na verdade. A freguesa é meio insegura, não é? Moça tão bonita, não deveria ser assim". Os olhares se encontraram de novo, e ela sorriu. "Eu mal consigo olhar tanto pra esses olhos tão profundos", disse ele. Ela desviou o olhar e contemplou o vazio por alguns instantes "É, mas eles estão caídos e trêmulos agora", disse, sem jeito. "A freguesa tem sono, ou choras? É tristeza que ainda a aflige?", indagou o vendedor, preocupado. "Se eventualmente eu fizer cair lágrimas de felicidade aí posso até largar os negócios: viro viajante. Posso te levar pra um tal paraíso perdido, você teria um lugar garantido no meu bote". A moça sorriu, endireitou-se, balançou sobre as pernas - e ele também, em sincronia - e ela disse: "Tenho um pouco de medo". "Ora, a freguesa pode ficar tranquila. Primeiro nada que ela não faça de coração aberto será cobrado. E segundo: é uma terra cheia de cores e tons". Ela sorriu, aparentemente amolecida, e do seu riso bobo perguntou em tom de brincadeira. : "Tem pássaros lá?". O vendedor sorriu e perguntou: "A freguesa gosta de pássaros? Tem o que ela quiser lá. Acontece até d'eu ter uma amostra dessa terra por aqui", disse revirando o tabuleiro. Achou um pequeno conta gotas e estendeu a moça: "Basta uma gotinha na água que você beber, e você sonhará com este paraíso perdido". A moça aceitou instantaneamente, sorrindo. "Vou precisar", e riu. "Espero que a terra te encante, freguesa. Basta ser sincera e desejar profundo. Espero que você venha logo comprar essas coisas de mim".
Ela sorriu e olhou pra ele. Ele sorriu e olhou pra ela.
sexta-feira, 12 de dezembro de 2014
Amor verde
Transcenda o contexto do meu texto, o vazio da minha alma, palma a palma. Abrace este amor verde e me beije. Uma vez mais, porque está frio, de novo, porque chove, e mais uma vez, porque eu quero. Melhor: desista de ir embora. Fique aqui. Se no jogue no poço, no meu pescoço, cause um alvoroço. Pinte o sol no céu nublado da minha mente, ou deixe lá chover e me abrace. Tanque a porta, pare o tempo, quebre o relógio - ele me dá ódio e você é o meu ópio. Encontre-me num dia ensolarado e pare-me ao acaso. Arranque-me um sorriso, deixe eu te dar um abraço: me tire do abismo, me dê mais um sorriso e me devolva o riso. Tranque esta porta, só por algumas horas, aqui e agora.
Me beije, seja, ouse, veja. Se perca, enlouqueça. Surte, ame, jure: não se segure.
Me beije, seja, ouse, veja. Se perca, enlouqueça. Surte, ame, jure: não se segure.
terça-feira, 9 de dezembro de 2014
o som da sua voz
"não me deixa na chuva, não
não me tire do coração,
não me diga que vai sem mim
...
não me deixe na noite, não
na travessa da desolação
não me diga que quer assim"
domingo, 7 de dezembro de 2014
e, se, por acaso, isso acabar e a gente se encontrar
um sorriso,
pra mudar o mundo,
e se, por acaso
vier com olhos de felicidade
ele pinta no céu aveludado um sol brilhante
mesmo que o dia esteja nublado
um olhar,
pro tempo parar,
e se, por acaso,
os nossos olhos se encontrarem
eles destrancam o baú da alma
e ela há de transbordar
um cheiro,
pro coração bater forte
e se, por acaso,
trocam-se algumas palavras
há felicidade
mesmo num dia triste
um abraço,
pra se cumprimentar ou despedir
e se, por acaso,
ele é forte e enlaça,
e deixa no laço um desejo de ficar
o dia tem mais graça
um beijo,
pra ficar na memória
e se, por acaso,
não.
não precisa haver nada além.
mas
e
se
por acaso
isso acabar
e a gente puder
se encontrar
e
enfim
começar
há de haver felicidade.
pra mudar o mundo,
e se, por acaso
vier com olhos de felicidade
ele pinta no céu aveludado um sol brilhante
mesmo que o dia esteja nublado
um olhar,
pro tempo parar,
e se, por acaso,
os nossos olhos se encontrarem
eles destrancam o baú da alma
e ela há de transbordar
um cheiro,
pro coração bater forte
e se, por acaso,
trocam-se algumas palavras
há felicidade
mesmo num dia triste
um abraço,
pra se cumprimentar ou despedir
e se, por acaso,
ele é forte e enlaça,
e deixa no laço um desejo de ficar
o dia tem mais graça
um beijo,
pra ficar na memória
e se, por acaso,
não.
não precisa haver nada além.
mas
e
se
por acaso
isso acabar
e a gente puder
se encontrar
e
enfim
começar
há de haver felicidade.
quinta-feira, 27 de novembro de 2014
Espera
Já passou da hora de você chegar
E eu ainda estou te esperando
Não há luz, nem cor, nem cheiro, nem música. Não há paz.
Eu não estou bêbado, já vai dar meia noite
Tic-tac: o relógio me lembra como o tempo é fugaz.
Essa espera angustia
Já vai dar uma,
Estou no mesmo lugar.
Esse silêncio que corta
A retina da rotina, dói.
Neste dia ensolarado
de manhã aveludada
Pintei um desejo no céu azul
Em meio aos sons aturdidos dessa cidade
Sussurrei os sonhos febris
Sonhados no calor do verão
São quase duas
E eu ainda sinto o gosto
Ainda há um sorriso
Um desejo escondido
Uma vontade de parar o tempo
Naquele momento.
Estou nu, mais uma vez
De peito aberto, uma vez mais
Meu coração numa bandeja.
Aquela carta numa caixa
É tarde, não vejo nada da janela
Queria ver o sol de novo com você.
Procuro nesses desencontros
Os nossos encontros
Nossas confissões, ditas suavemente,
Os nossos desejos,
Escondidos á meia luz
E me pergunto
O que vai ser disso aqui?
Vai dar três
E eu vou me render
Ás sombras
Dessa solidão.
terça-feira, 25 de novembro de 2014
Lembrete
Se tudo der errado, procure-me do mesmo jeito que tudo começou.
E eu vou saber que é a hora de fazer as coisas certas.
E eu vou saber que é a hora de fazer as coisas certas.
sexta-feira, 21 de novembro de 2014
Tipo
Você é do tipo que faz um X na minha mente e diz "decifra-me, ou te devoro".
E mesmo que eu te decifrasse, você teria várias outras letras com as quais ocupar a gangorra da minha mente.
E mesmo que eu te decifrasse, você teria várias outras letras com as quais ocupar a gangorra da minha mente.
quarta-feira, 19 de novembro de 2014
Ohrwurm
Estou de novo neste lugar onde os ventos sopram de uma maneira poética. Estou de novo encarando essa árvore cujas folhas secas ainda caem. Estou de novo olhando as folhas secas caírem, e se amontoarem no chão tão cheias de dor e arrependimento de terem ousado a dor da queda. Estou de novo embriagado debaixo dessa meia luz. Estou de novo desejando escutar essa música em um volume tão alto que faça meu ouvidos explodirem e eu não escute mais o que essa gente fale.
Canção de desgosto
Queria arrancar essa dor do peito,
como se pudesse arrancar a própria carne.
Um tiro no peito, vários remédios.
Lançar-me ao sol, bem de perto
queimar-me por inteiro.
Livrar-me da sombra,
Que insiste em me abraçar.
Quero cavar um buraco no chão
E enterrar essas coisas lá.
Ou voar pra dez mil milhas daqui
Pra recomeçar.
Espero ver mais coragem
Em outros rostos
Sentir outro gosto
que não o desgosto.
como se pudesse arrancar a própria carne.
Um tiro no peito, vários remédios.
Lançar-me ao sol, bem de perto
queimar-me por inteiro.
Livrar-me da sombra,
Que insiste em me abraçar.
Quero cavar um buraco no chão
E enterrar essas coisas lá.
Ou voar pra dez mil milhas daqui
Pra recomeçar.
Espero ver mais coragem
Em outros rostos
Sentir outro gosto
que não o desgosto.
terça-feira, 11 de novembro de 2014
O destino das folhas
Sempre que a brisa é forte as folhas da árvore dançam, embaladas num ritmo suave. Normalmente frágeis, elas caem no chão ao serem embaladas. A queda é lenta e harmoniosa. Devagar as folhas pairam sob o ar, como se resistissem a queda de inicio, mas logo aceitam e se rendem ao destino iminente. Depois de viver a queda, chegam ao chão. Chegar ao chão é duro. Chega-se ao chão depois de muito tempo, mas sempre há a sensação de que chegou-se ali muito rápido. O gosto do chão é ruim. Tão amargo quanto o gosto do desgosto. Ao chegar no chão, a lembrança da queda é sempre iminente. As folhas, ao fim da queda, se desfazem. Retornam à terra. E pro tempo futuro deixam de existir. É, na verdade, como se nunca tivessem existido. Depois o tempo passa e sopra a pilha de folhas mortas no chão, carregando um punhado pra longe. Cada dia um punhado. Como se quisesse levar todas as folhas dali e deixar só aquele vazio que resta da queda.
segunda-feira, 10 de novembro de 2014
O diálogo do palhaço triste e da bailarina que tinha feito ele feliz
"É tão clichê tudo isso."
"Isso o que?"
"De ajudar os outros e não ajudar a si mesmo"
"É mais fácil ver as coisas de fora da caixa"
"É, poeta? Me diz você ..."
"Eu não: sou só fingidor"
"Porque você escolheu ser assim?"
"Eu escolhi? Não lembro de ter escolhido"
"O que você faz pra ser feliz?"
"Não faço, não sou"
quinta-feira, 30 de outubro de 2014
Silenciosa cólera
O papel branco fita o pincel, malandro
E o convida pra dançar
não saem textos dessa folha em branco.
Há uma melodia,
Que esconde a cólera consigo
Mas esses acordes não combinam,
São tronchos, e ela já não faz mais sentido
Há esse silêncio, agora
Da quimera de sonhos, jogada no asilo
Pra rolar alguns dados e esperar a sorte
Guardar desejos em sigilo
Há esse desejo, que tenta,
em vão,
Empurrar pra fora palavras não ditas
O grito está preso na garganta
Engasga e golfa
Se debate e luta
Está em cólera
E esse silêncio corta.
E o convida pra dançar
não saem textos dessa folha em branco.
Há uma melodia,
Que esconde a cólera consigo
Mas esses acordes não combinam,
São tronchos, e ela já não faz mais sentido
Há esse silêncio, agora
Da quimera de sonhos, jogada no asilo
Pra rolar alguns dados e esperar a sorte
Guardar desejos em sigilo
Há esse desejo, que tenta,
em vão,
Empurrar pra fora palavras não ditas
O grito está preso na garganta
Engasga e golfa
Se debate e luta
Está em cólera
E esse silêncio corta.
domingo, 26 de outubro de 2014
quarta-feira, 22 de outubro de 2014
Último
eu olho e nada vejo, meus olhos só vagueiam
te procuro, mas não acho, e me perco
amo, e em silêncio frustrado encolerizo e quebro o espelho
e só o que me resta já não me basta
sabia que isso seria uma ironia: teria que juntar esses cacos,
que o espelho se partiria em mil pedaços
seria melhor, talvez, ter guardado tudo numa garrafa e jogado fora
assim, como quem não quer nada
do mesmo modo que as minhas perguntas são ignoradas
jeito não tenho a dar
mais e mais quero jogar tudo fora nessas águas negras, neste mar
profundo e desconhecido.
te procuro, mas não acho, e me perco
amo, e em silêncio frustrado encolerizo e quebro o espelho
e só o que me resta já não me basta
sabia que isso seria uma ironia: teria que juntar esses cacos,
que o espelho se partiria em mil pedaços
seria melhor, talvez, ter guardado tudo numa garrafa e jogado fora
assim, como quem não quer nada
do mesmo modo que as minhas perguntas são ignoradas
jeito não tenho a dar
mais e mais quero jogar tudo fora nessas águas negras, neste mar
profundo e desconhecido.
segunda-feira, 20 de outubro de 2014
Chuva
Havia um punhado de textos que deveriam ter sido escritos no vapor no espelho, mas água morna não embaça vidro, e os versos tão bonitos foram perdidos. Escorreram pelo ralo como mentiras tão bem feitas e se perderam num esgoto imundo, nebuloso como os escombros de uma mente atormentada. Quando os versos tão bonitos tentaram ser resgatados formaram um texto troncho. Da neblina fez-se chuva. E choveu, de novo. Mas chove sempre nos jardins de uma mente nebulosa. Peneira uma chuvinha fina, daquelas que não molha. E ao mesmo tempo daquelas que é suficiente pra fazer desaguar no oceano a melancolia desses dias cinzentos. Tão rápido ela faz-se tempestade e traga pra dentro de si todo o céu azul que desperta a manhã. A chuva silencia o barulho. E é o barulho que liga a gente ao mundo. Ele atesta existência. Quando o barulho vira música, há de haver felicidade. Mas com essa chuva eu nada posso ouvir.
quinta-feira, 16 de outubro de 2014
Tempo
Faz tempo que o sol não jorra da janela. Faz tempo que não chove e é frio do lado de fora. Faz tempo que a casca da árvore cresce e a floresta adormece. Faz tempo que a fumaça do cigarro queima e ele não apaga. Faz tempo que esse cheiro toma conta da casa e ninguém sente. Faz tempo que a tristeza é um colar e faz tempo que ela é uma corrente. Faz tempo que as palavras não são ditas. Faz tempo que a falta é sentida. Faz tempo que a cidade não é mais tão bonita, faz tempo que as coisas fazem sentido. Faz tempo que a esperança está doente e faz tempo que ninguém sabe se ela vai se recuperar. Faz tempo que os males são irremediáveis e faz tempo que tenta-se negar isso. Faz tempo que tem-se dado tempo ao tempo e faz tempo que o conselho deixou de servir. Faz tempo que as tentativas são frustradas. Faz tempo que faz tempo tudo isso. O tempo faz o tempo. O tempo faz com que a janela fique fechada. O tempo faz com que só faça sol e seja quente. O tempo faz com que a floresta adormeça. O tempo faz com que o cheiro seja imperceptível. O tempo faz com que a tristeza passe. O tempo faz com que a tristeza volte. O tempo faz com que as palavras não saiam da boca. O tempo faz sentir falta. O tempo faz com que a cidade seja feia. O tempo faz com que as coisas não tenham sentido. O tempo adoece a esperança e faz com que ninguém saiba da sua saúde. O tempo não remedia o mal, e se o tempo não remedia o mal, nada mais remedia. O tempo faz com que o tempo não tenha tempo e que os conselhos se desgastem. O tempo faz tempo todo tempo. O tempo fecha a janela. Faz tempo que todo o meu amor é vão. O tempo faz que todo meu amor é vão. Vão faz o tempo e todo o meu amor. O meu amor é vão e faz o tempo. Vão, oh meu amor, é o tempo. Faz tempo.
segunda-feira, 13 de outubro de 2014
O brado de ódio
Nu, de novo, as feridas abertas.
Mais uma vez está de peito aperto.
Está sentado na rua, desolado,
banhado pela luz alaranjada
daquela cidade imunda.
Está frustrado,
de novo,
cansado de vagar a esmo.
O tempo é muito vagaroso:
ouve-se uma pergunta tímida
- "até quando?" -,
mas não há resposta que tranquilize
não existem palavras
além das que se quer ouvir
que podem mudar aquilo.
Está com raiva, de novo
a cinzenta canção de dor e perda se transforma mais uma vez num brado de ódio
nele engasga toda angústia,
todo desejo de mudança,
toda frustração da estar no mesmo lugar a tanto tempo.
Nele engasga a falta de perspectiva,
o desespero, o cansaço de tentar e errar e repetir esse processo infinitamente.
Nele está o sentimento de mal irremediável:
tenta relutar em aceitar o fato, mas segue e termina como está.
Nele está a agonia de não perceber as coisas escondidas á meia luz,
mas de enxergar os espaços na poesia social
e não conseguir ocupá-los.
Sobre ele paira a ausência, na forma de uma sombra escura.
Mas o brado é silencioso.
Habita os escombros de uma mente nebulosa
e é como um sentimento adormecido,
que ora desperta e preenche
e ora adormece e reconforta.
Mais uma vez está de peito aperto.
Está sentado na rua, desolado,
banhado pela luz alaranjada
daquela cidade imunda.
Está frustrado,
de novo,
cansado de vagar a esmo.
O tempo é muito vagaroso:
ouve-se uma pergunta tímida
- "até quando?" -,
mas não há resposta que tranquilize
não existem palavras
além das que se quer ouvir
que podem mudar aquilo.
Está com raiva, de novo
a cinzenta canção de dor e perda se transforma mais uma vez num brado de ódio
nele engasga toda angústia,
todo desejo de mudança,
toda frustração da estar no mesmo lugar a tanto tempo.
Nele engasga a falta de perspectiva,
o desespero, o cansaço de tentar e errar e repetir esse processo infinitamente.
Nele está o sentimento de mal irremediável:
tenta relutar em aceitar o fato, mas segue e termina como está.
Nele está a agonia de não perceber as coisas escondidas á meia luz,
mas de enxergar os espaços na poesia social
e não conseguir ocupá-los.
Sobre ele paira a ausência, na forma de uma sombra escura.
Mas o brado é silencioso.
Habita os escombros de uma mente nebulosa
e é como um sentimento adormecido,
que ora desperta e preenche
e ora adormece e reconforta.
quarta-feira, 13 de agosto de 2014
sexta-feira, 8 de agosto de 2014
domingo, 15 de junho de 2014
A poesia social
a felicidade é vã como o céu azul de um dia ensolarado e eu de ressaca
o entardecer é mais inebriante por entre os prédios dessa cidade
como o seu sorriso, perdido e escondido
numa alegria que vem do nada
a vida é cretina, perversa e pervertida
é um mar de vastas emoções e pensamentos imperfeitos
e eu dentro de um carro, longe daqui, a dez mil milhas por hora
vendo o céu azul me tragar como se eu fosse fumaça
na escuridão que esconde a noite
não posso me esquivar
dos espaços vazios em que me esbarro
e vejo, escancarada,
a poesia social
o entardecer é mais inebriante por entre os prédios dessa cidade
como o seu sorriso, perdido e escondido
numa alegria que vem do nada
a vida é cretina, perversa e pervertida
é um mar de vastas emoções e pensamentos imperfeitos
e eu dentro de um carro, longe daqui, a dez mil milhas por hora
vendo o céu azul me tragar como se eu fosse fumaça
na escuridão que esconde a noite
não posso me esquivar
dos espaços vazios em que me esbarro
e vejo, escancarada,
a poesia social
segunda-feira, 9 de junho de 2014
Quanto valem os seus sonhos?
"Quanto vale o seu sonho?", indagou-me a figura. "Um punhado de reais?". Por longo tempo fiquei, mais uma vez, calado na escuridão de uma interrogação pungente e tristonha, como o céu nublado daquela manhã de segunda. Não existe dúvida maior do que aquela que divide o sonho e a realidade. Que cruza os meandros da consciência e escreve num quadro negro com giz rasgando e silêncio da paz interior: "decifra-me, ou te devoro". Eu talvez ainda queira tentar mudar o mundo. Existem coisas que dado o erro inevitável ainda vale a tentativa. Eu talvez ainda possa mudar o mundo. E os meus sonhos não valem um punhado de reais.
quinta-feira, 5 de junho de 2014
A poesia social
Paz hoje é caos urbano
O espelho, a janela do ônibus
A meditação não é silenciosa
É admirar o céu rasgado de concreto
Em meio ao mar de gente nervosa
De dia é quente
Aperto os olhos contra o sol
Bocejo, desejo, espero
Penso, reflito, divago
Retorno, retraio, entristeço
Devaneio e renasço
De noite, quando a rua é laranja
Os carros andam velozes
A vida é mais agitada
O cansaço inebriante
Exposto em olhos profundos
Que lá no fundo tragam o mundo
O espelho, a janela do ônibus
A meditação não é silenciosa
É admirar o céu rasgado de concreto
Em meio ao mar de gente nervosa
De dia é quente
Aperto os olhos contra o sol
Bocejo, desejo, espero
Penso, reflito, divago
Retorno, retraio, entristeço
Devaneio e renasço
De noite, quando a rua é laranja
Os carros andam velozes
A vida é mais agitada
O cansaço inebriante
Exposto em olhos profundos
Que lá no fundo tragam o mundo
segunda-feira, 2 de junho de 2014
A poesia social
As pessoas dormem
Seus sonhos se esvaem pelas janelas
Elas esperam pelo final
Da hora do dia da semana do mês do ano
Pra aliviar cansaço e dor
Triste é pensar que o mundo não espera
que as coisas são findas
Voláteis, dispersas
Só posso concluir que felicidade
É realmente
A ausência de percepção de que as coisas um dia acabam
Minha mente lucida volta-se sempre para o tempo
Nela a mudança é rápida
Um sopro
E o tempo pra mudar já se foi.
Mas, temerosa, sente que talvez
Se o tempo passasse mais rápido a vida seria nada
Vã como a tarde de um dia ensolarado de domingo
Vil como a noite e o cansaço
Perversa como os desejos de uma mente febril
E abstrata como os corpos em movimento
Numa noite enluarada
E o pensamento relevado
Naquele momento específico em que os corpos falam
Ah, se eu pudesse descrever,
capturar de alguma forma
O momento em que os corpos falam
a mente abre mão de governar
E a poesia social espalha-se em música
Uma melodia escrita no vento
Por uma menina - Poesia -,
De vestido azul e varinha
Que a faz rodopiar
Por entre corpo e mente
Na profunda escuridão da noite boemia
Seus sonhos se esvaem pelas janelas
Elas esperam pelo final
Da hora do dia da semana do mês do ano
Pra aliviar cansaço e dor
Triste é pensar que o mundo não espera
que as coisas são findas
Voláteis, dispersas
Só posso concluir que felicidade
É realmente
A ausência de percepção de que as coisas um dia acabam
Minha mente lucida volta-se sempre para o tempo
Nela a mudança é rápida
Um sopro
E o tempo pra mudar já se foi.
Mas, temerosa, sente que talvez
Se o tempo passasse mais rápido a vida seria nada
Vã como a tarde de um dia ensolarado de domingo
Vil como a noite e o cansaço
Perversa como os desejos de uma mente febril
E abstrata como os corpos em movimento
Numa noite enluarada
E o pensamento relevado
Naquele momento específico em que os corpos falam
Ah, se eu pudesse descrever,
capturar de alguma forma
O momento em que os corpos falam
a mente abre mão de governar
E a poesia social espalha-se em música
Uma melodia escrita no vento
Por uma menina - Poesia -,
De vestido azul e varinha
Que a faz rodopiar
Por entre corpo e mente
Na profunda escuridão da noite boemia
domingo, 11 de maio de 2014
Sujeitos perfeitos
a minha poesia é o que me move
mas é também o que me mata
nos recantos da alma metralhada
ainda há melodia
que narra a vida
me move
como minha poesia
e as vezes me vejo
em outros sujeitos
de todos os sujeitos
no canto de um bar
ou numa mesa numa sala de estar
e eu cometo o erro
de pensar as vezes
que esses sujeitos
são todos perfeitos
mas é também o que me mata
nos recantos da alma metralhada
ainda há melodia
que narra a vida
me move
como minha poesia
e as vezes me vejo
em outros sujeitos
de todos os sujeitos
no canto de um bar
ou numa mesa numa sala de estar
e eu cometo o erro
de pensar as vezes
que esses sujeitos
são todos perfeitos
sábado, 3 de maio de 2014
Raiva ou paranoia
Ás vezes eu sinto vontade de simplesmente mandar os senhores ao inferno,
mas frequentemente me vem a ideia de que isso é mera paranoia.
Ou será que não?
mas frequentemente me vem a ideia de que isso é mera paranoia.
Ou será que não?
terça-feira, 29 de abril de 2014
Minh'alma
da janela vejo o céu e uma camisa rasgada
pendurada no jardim, que também tem uma flor amarelada
a flor é hipocondria, a camisa minha alma
minh'alma rasgada e esfarrapada
um pano pisado e sujo,
deixado de lado
no canto da sala de estar
no dia que é de chuva
pendurada no jardim, que também tem uma flor amarelada
a flor é hipocondria, a camisa minha alma
minh'alma rasgada e esfarrapada
um pano pisado e sujo,
deixado de lado
no canto da sala de estar
no dia que é de chuva
Metamorfose carmesim
A tristeza vejo em olhos sem vida.
O pé nervoso marca um compasso histérico contra o chão.
A boca masca nada raivosamente.
Os olhos vagueiam a procura de nada e se fixam em alguma coisa aleatória.
As mãos cruzadas sobre as pernas, sentadas na calçada de uma rua em algum lugar qualquer dessa cidade imunda.
No céu escuro, estrelas. Nas ruas, pessoas. Gestos, linhas, feições, vinho e poesia.
A franja lhe avança contra os olhos, mas suas mãos estão inertes demais - envolvidas em algo profundo - pra arrumá-la.
Mas ela é bonita assim.
E outrora a felicidade mostra-se em um sorriso - flor que nasce em meio as pedras: a vida que desperta em um dia frio de verão, e sorri feliz ao acordar e contemplar o seu sonho de primavera.
Sua silhueta esguia contra a luz amarelada de um bar.
Há algo em seus olhos. No seu cabelo metamorfoseante. Nos seus gestos, na forma como ela anda, fala e ri - nos saltos que ela dá quando está alegre, na fala que imita uma criança pra mimar alguém e no sorriso que aperta os olhos verdes. Há algo em seu riso. Nos seus olhos. No seu abraço. No jeito como você não canta e mesmo assim encanta. Há algo secreto, escondido nos dedos
ou no seu cabelo.
O pé nervoso marca um compasso histérico contra o chão.
A boca masca nada raivosamente.
Os olhos vagueiam a procura de nada e se fixam em alguma coisa aleatória.
As mãos cruzadas sobre as pernas, sentadas na calçada de uma rua em algum lugar qualquer dessa cidade imunda.
No céu escuro, estrelas. Nas ruas, pessoas. Gestos, linhas, feições, vinho e poesia.
A franja lhe avança contra os olhos, mas suas mãos estão inertes demais - envolvidas em algo profundo - pra arrumá-la.
Mas ela é bonita assim.
E outrora a felicidade mostra-se em um sorriso - flor que nasce em meio as pedras: a vida que desperta em um dia frio de verão, e sorri feliz ao acordar e contemplar o seu sonho de primavera.
Sua silhueta esguia contra a luz amarelada de um bar.
Há algo em seus olhos. No seu cabelo metamorfoseante. Nos seus gestos, na forma como ela anda, fala e ri - nos saltos que ela dá quando está alegre, na fala que imita uma criança pra mimar alguém e no sorriso que aperta os olhos verdes. Há algo em seu riso. Nos seus olhos. No seu abraço. No jeito como você não canta e mesmo assim encanta. Há algo secreto, escondido nos dedos
ou no seu cabelo.
domingo, 13 de abril de 2014
segunda-feira, 31 de março de 2014
Procura
Disposto o papel em branco traço retas linhas, feições.
Construo, desfaço, refaço
E despedaço
Minha ávida e incessante procura pelas perfeições.
Construo, desfaço, refaço
E despedaço
Minha ávida e incessante procura pelas perfeições.
domingo, 30 de março de 2014
Desejo
Se,
eu pudesse recomeçar
a milhões de milhas daqui
eu
poderia
me encontrar.
eu acharia um caminho.
eu pudesse recomeçar
a milhões de milhas daqui
eu
poderia
me encontrar.
eu acharia um caminho.
sábado, 29 de março de 2014
Sinestesia
Eu não diria que os olhos dela são de cigana, oblíquos e dissimulados porque isso seria não somente um clichê como também uma inverdade. Devo dizer que os olhos dela não são nem um pouco dissimulados. São olhos sinceros. Tão profundos que parecem tragar o mundo para dentro de si e transformar tudo em um brilho translúcido. Por onde passa ela deixa o ressoar de sua presença: uma música com sabor de felicidade. Seu sorriso tem um gosto doce. E as curvas do seu corpo são pura poesia. Só o mero pensamento é tão inebriante quanto vinho. E enlouquecedor, como absinto.
quarta-feira, 19 de março de 2014
...
Há um homem vagando pelas ruas escrevendo num livro de papel surrado canções sobre a vida.
Ele canta canções de felicidade que aos ouvidos dos outros parecem cantilenas de tristeza.
E assim adormecem suas histórias de primavera, morrendo aos poucos como a luz de um dia quente de verão.
Existe inspiração além da tristeza? Ele se pergunta.
E o silêncio responde, pairando sobre o ar.
Será um sim, ou um não?
Ele canta canções de felicidade que aos ouvidos dos outros parecem cantilenas de tristeza.
E assim adormecem suas histórias de primavera, morrendo aos poucos como a luz de um dia quente de verão.
Existe inspiração além da tristeza? Ele se pergunta.
E o silêncio responde, pairando sobre o ar.
Será um sim, ou um não?
quinta-feira, 6 de março de 2014
Porque não posso entender a vida
Uma luz fraca ilumina uma parede. Luz amarela, cor de sol. Contra ela uma sombra dança o reflexo de uma menina. Dela não vejo nada além da silhueta escura, e quando desvio os olhos vejo somente seu par - a sombra - contra a parede, a repetir seus movimentos de maneira perfeita. Minha curiosidade desponta no desejo de saber quem é a dançarina, mas é inútil. Seus movimentos se repetem em uma cadência confortável e graciosa, como se fossem detalhadamente pensados, refletidos, calculados e testados antes que fossem feitos.
Abaixo a cabeça e vejo um chão de madeira.
Vigas envernizadas que se abrem e me engolem como uma escada em espiral.
A menina vem junto, caindo pela escada, mas não vejo seu rosto. Pelo contrário - ela some. E a escada encolhe e me joga para longe.
Vou me distanciando, involuntariamente, descendo a escada em espiral que volta a se abrir.
A imagem se distorce, trêmula. Se parte em mil pedaços que se espalham em um espaço-tempo aleatório.
E há uma música. Há uma música escrita no chão. Mas não posso ler a música. É a maldita única peça faltante em um quebra cabeça que destrói toda imagem. Insubstituível. Insubstituível porque um dia ela esteve lá, ou quase, na mente ou na realidade.
Ou na mente e na realidade.
Porque não não posso ler essa música?
Abaixo a cabeça e vejo um chão de madeira.
Vigas envernizadas que se abrem e me engolem como uma escada em espiral.
A menina vem junto, caindo pela escada, mas não vejo seu rosto. Pelo contrário - ela some. E a escada encolhe e me joga para longe.
Vou me distanciando, involuntariamente, descendo a escada em espiral que volta a se abrir.
A imagem se distorce, trêmula. Se parte em mil pedaços que se espalham em um espaço-tempo aleatório.
E há uma música. Há uma música escrita no chão. Mas não posso ler a música. É a maldita única peça faltante em um quebra cabeça que destrói toda imagem. Insubstituível. Insubstituível porque um dia ela esteve lá, ou quase, na mente ou na realidade.
Ou na mente e na realidade.
Porque não não posso ler essa música?
Quanto tempo?
e eis que do papel queimado sobrou apenas aquela palavra solitária escrita em letras garrafais
NENHUM
Felicidade
naquela escuridão,
te vi
e vivi
e concluí
que a felicidade não é nada
além da ausência da percepção de que as coisas sempre acabam
e na profunda escuridão fiquei por longo tempo, pensando, temendo
te vi
e vivi
e concluí
que a felicidade não é nada
além da ausência da percepção de que as coisas sempre acabam
e na profunda escuridão fiquei por longo tempo, pensando, temendo
sonhando sonhos que nenhum mortal jamais sonhou
sábado, 4 de janeiro de 2014
Palavras soltas
Os detalhes desviam-me do caminho final. Distorcem a percepção.
Defino, limito. Separo, segrego. Reparto, parto. Vou embora. Largo.
Sonho, e da consciência de estar sonhando, já não sinto o mesmo gosto.
E desse amontoado de palavras soltas construo um sentido.
Minhas próprias ilusões distraem o tempo; mendigam esperança.
Crescem, envelhecem, morrem.
Renascem.
Já não veem mais com a coisas com o mesmo sentido.
E o que foi construído se distorce. Torce. Retorce. Se destrói. Dói.
Vejo o relógio passar.
Repetitivo.
Condescendente.
Cruel.
E ele para, de repente.
Não passa o tempo. A pilha acabou. O tempo vai parar, então, por causa do meu relógio? Não.
E essas palavras soltas continuam a ecoar em minha mente. Meu estado imaginário. Temporário. Volátil, disperso. Mas o mundo espera. Espera, talvez. Um mundo brilhante. Um admirável mundo novo.
Dentro da minha mente.
Defino, limito. Separo, segrego. Reparto, parto. Vou embora. Largo.
Sonho, e da consciência de estar sonhando, já não sinto o mesmo gosto.
E desse amontoado de palavras soltas construo um sentido.
Minhas próprias ilusões distraem o tempo; mendigam esperança.
Crescem, envelhecem, morrem.
Renascem.
Já não veem mais com a coisas com o mesmo sentido.
E o que foi construído se distorce. Torce. Retorce. Se destrói. Dói.
Vejo o relógio passar.
Repetitivo.
Condescendente.
Cruel.
E ele para, de repente.
Não passa o tempo. A pilha acabou. O tempo vai parar, então, por causa do meu relógio? Não.
E essas palavras soltas continuam a ecoar em minha mente. Meu estado imaginário. Temporário. Volátil, disperso. Mas o mundo espera. Espera, talvez. Um mundo brilhante. Um admirável mundo novo.
Dentro da minha mente.
Entardecer
Por entre os prédios da cidade o sol morre. Deita-se vagarosamente, no horizonte, colorindo o céu.
Vê-se, ainda, um céu azulado de um dia quente. Nuvens esparsas flutuam no ar e caminham a esmo.
Um avião risca o plano azul, e a nuvem que ele gera se dispersa rapidamente, juntando-se as demais.
O sol se abaixa um pouco mais e o azul se torna mais pálido.
As ruas da cidade se tornam mais escuras. Luzes alaranjadas acendem sem um padrão definido.
As árvores se agitam com uma brisa fria e os pássaros voam de volta pra os ninhos: agora era a hora dos morcegos alçarem os céus e dançaram em volta de árvores densas.
O sol dá mais um passo para o horizonte e o azul pálido se torna ainda mais esbranquiçado.
Um raio rosado de repente corta o branco pálido do céu, trazendo o desequilibro pungente - nada mais que uma nuvem colorida pela luz moribunda do sol.
E depois do raio rosa outras nuvens mudam de sua cor branca - ocultas naquele plano de fundo também branco que era o céu - para cores rosadas.
Vários tons de vermelho agora mancham o céu; nuvens coloridas formam espirais.
Mais um instante se passa, e o céu muda novamente. Um degradê de tons de vermelho toma conta do plano de fundo branco, com cores mais vermelhas e vivas no horizonte e tons mais claros longe de lá.
As nuvens agora estavam pintadas de laranja, pairando sobre um pano de fundo colorido.
Mais um passo, e o sol vermelho se vai cada vez mais.
O mar, invejoso, copiava, em suas águas claras, o que acontecia no céu.
Mas o tempo passava, e do mar o reflexo do céu sumia, sendo sugado pela distância e pelo tempo.
Pelo silêncio das pessoas ali perto.
E assim o céu escureceu.
A luz morreu no horizonte, deixando a escuridão que não permite a percepção do tempo abraçar cada canto, canta esquina, cada rua, cada casa daquela cidade.
Mas sempre haveriam, as pessoas sabiam, as luzes.
Que guiariam o caminho até que o sol nascesse de novo.
Vê-se, ainda, um céu azulado de um dia quente. Nuvens esparsas flutuam no ar e caminham a esmo.
Um avião risca o plano azul, e a nuvem que ele gera se dispersa rapidamente, juntando-se as demais.
O sol se abaixa um pouco mais e o azul se torna mais pálido.
As ruas da cidade se tornam mais escuras. Luzes alaranjadas acendem sem um padrão definido.
As árvores se agitam com uma brisa fria e os pássaros voam de volta pra os ninhos: agora era a hora dos morcegos alçarem os céus e dançaram em volta de árvores densas.
O sol dá mais um passo para o horizonte e o azul pálido se torna ainda mais esbranquiçado.
Um raio rosado de repente corta o branco pálido do céu, trazendo o desequilibro pungente - nada mais que uma nuvem colorida pela luz moribunda do sol.
E depois do raio rosa outras nuvens mudam de sua cor branca - ocultas naquele plano de fundo também branco que era o céu - para cores rosadas.
Vários tons de vermelho agora mancham o céu; nuvens coloridas formam espirais.
Mais um instante se passa, e o céu muda novamente. Um degradê de tons de vermelho toma conta do plano de fundo branco, com cores mais vermelhas e vivas no horizonte e tons mais claros longe de lá.
As nuvens agora estavam pintadas de laranja, pairando sobre um pano de fundo colorido.
Mais um passo, e o sol vermelho se vai cada vez mais.
O mar, invejoso, copiava, em suas águas claras, o que acontecia no céu.
Mas o tempo passava, e do mar o reflexo do céu sumia, sendo sugado pela distância e pelo tempo.
Pelo silêncio das pessoas ali perto.
E assim o céu escureceu.
A luz morreu no horizonte, deixando a escuridão que não permite a percepção do tempo abraçar cada canto, canta esquina, cada rua, cada casa daquela cidade.
Mas sempre haveriam, as pessoas sabiam, as luzes.
Que guiariam o caminho até que o sol nascesse de novo.
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