Ódio tem gosto de sangue. Gosto que não sai com banho e bala, que pinga sobre os lábios e escorre pelos dentes, que a língua degusta sem querer e a garganta engole com relutância. Ódio tem cheiro de vinagre, que não sai com banho e nem perfume, que fica encrustado na pele como um lembrete infeliz, uma brincadeira de mal gosto que leva aquele que sente o ódio a querer arrancar a própria pele. Ódio é lábio rasgado e costurado, que gruda e trança e fecha a boca, e impede o grito e entala na garganta toda a raiva que arde como fogueira cheia de lenha. Que impede a embriaguez e o prazer da comida. Que humilha e fere o orgulho. Silêncio e impotência infringem mais ódio, que alimenta a fogueira e ela arde tanto mais que fere o corpo. Ódio é a repetição infinita de uma cena de covardia e a sensação perene de impunidade, o desejo de voltar ao passado pra fazer diferente e a sensação imediata de que isso é impossível. Ódio é o ranger dos dentes de tanta raiva. Tanta que dissipa o gosto de sangue e o cheiro de vinagre. Ódio é o fechar da mão num punho cerrado que soca a parede e nada sente, e portanto nada se alivia. Ódio é respiração pesada e o pensamento distorcido. Neblina que cega a razão e fogo que queima e atiça mais fogo. Ódio é o desejo de devolver tudo com as próprias as mãos, de cuspir de novo todo o sangue que caiu. É sensação incontrolável de querer destruir tudo e de gritar até ficar sem voz e sumir do mundo de uma vez por todas.
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